quarta-feira, 9 de março de 2011

Airton Monte - Desejo e Sonho

Airton Monte - 23 Fevereiro 2011 -

Desejo e sonho


Neste mês de fevereiro, os dias transcorrem, climaticamente hesitantes, entre o claro – escuro, com o sol brincando de esconde – esconde por entre as nuvens chuvosas, feito a alma da gente que também segue o mesmo ritmo. Ora estamos refulgindo de alegria e bom humor, ora estamos obscurecidos por eventuais laivos de tristeza. Naturalmente, este balanço pendular das emoções faz parte inevitável da chamada condição humana. O ser humano, em essência, não foge à regra de ser um habitual poço de ambiguidades. E é justamente essa capacidade de sermos imprevisíveis que nos torna interessantes, especiais, um mistério jamais de todo desvelado. Um processo contínuo de descobertas pessoais infindáveis. Uma equação, um teorema impossível de ser concluído com a tradicional expressão final do como queríamos demonstrar.


Penso, em relação ao ser humano, que a célebre indagação freudiana “o que querem as mulheres” deveria ser substituída, para tornar-se muito mais coberta de veracidade por outra mais abrangente: o que quer a humanidade? Aprendi, com os livros escritos por filósofos e sábios, e com a minha própria experiência existencial, ser o homem uma máquina de fabricar desejos e sonhos, que nada mais são do que o motor de nossa breve existência. Estamos sempre desejando algo que ainda não possuímos feito um menino querendo um brinquedo novo e quando o tem em suas mãos, brinca com ele durante alguns dias e logo o abandona, o deixa de lado, esquecido na caixa dos brinquedos velhos. É assim que somos de maneira fundamental e incorrigível. Humanidade, teu nome se chama desejo. Sobrenome insatisfação.


E os sonhos, como é que ficam, onde adentram esta história? E eu respondo, do alto da minha insignificância e da minha filosofia de botequim, que também somos uma máquina sonhar. E sonhamos incessantemente os sonhos mais possíveis quanto os mais impossíveis de serem realizados. Desejos e sonhos não passam de férteis produtos da mesma matriz que povoa nossos corações e mentes. O que seria de nós sem os nossos desejos e nossa, por vezes tola, mas poderosa capacidade de sonhar? Um homem sem desejos e sem sonhos é sinônimo perfeito de irrealidade, de uma entidade ilusória que só existe, viceja no pensamento empobrecido daqueles desesperados que não acreditam em mais nada. Um homem sem sonhos, sem desejos trata-se de uma vera impossibilidade, a não ser quando se está morto, com residência fixa na popular cidade dos pés juntos.


Sim, claro, bem sei que nem todos os desejos podem ser passíveis de realização, assim como a maioria dos nossos mais acalentados sonhos conseguem baixar em nosso terreiro. Coisas da vida, percalços do existir. Por isso, findamos por nos transformar, aqui e ali, em animais assoberbados de insatisfação com nós mesmos, com Deus e o mundo. Nossa curta passagem terrenal oscila entre o piquenique e o vale de lágrimas, entre o carnaval e a quarta – feira de cinzas. E daí? Desejar e sonhar, resistir quem há de? Eu não fujo à regra. Confesso-me movido a sonhos e desejos como qualquer dos meus semelhantes. Quanto mais por baixo estou no carrossel da vida, mais sonho e mais desejo. Sou um incurável usuário e dependente eterno do sonhar e do desejar. Sim, olho-me no espelho. Obviamente percebo que envelheci. Entanto, em cada ruga que me vinca o rosto, sonho e desejo fizeram moradia.

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